segunda-feira, 25 de março de 2013

É preciso "claricear"

Um nome para o que sou importa muito pouco. Importa o que eu gostaria de ser. O que eu gostaria de ser era uma lutadora. Quero dizer, uma pessoa que luta pelo bem dos outros. Isso desde pequena eu quis. Porque foi o destino me levando a escrever o que já escrevi, em vez de também desenvolver em mim a qualidade de lutadora que eu tinha? Em pequena, minha família por brincadeira chamava-me de “a protetora dos animais”. Porque bastava acusarem uma pessoa para eu imediatamente defendê-la. E eu sentia o drama social com tanta intensidade que vivia de coração perplexo diante das grandes injustiças a que são submetidas às chamadas classes menos privilegiadas. Em Recife eu ia visitar aos domingos a casa de nossa empregada em mocambos. E o que eu via me fazia prometer que não deixaria aquilo continuar. Eu queria agir. Em Recife onde morei até os 12 anos de idade, havia muitas vezes nas ruas um aglomerado de pessoas diante das quais alguém discursava ardorosamente sobre a tragédia social. E lembro-me de como eu vibrava e de como eu me prometia que  um dia  esta seria minha tarefa: a de defender os direitos dos outros. No entanto, o que terminei sendo, e tão cedo? Terminei sendo uma pessoa que procura profundamente o que sente e usa a palavra que o exprima. É pouco, é muito pouco.

Clarice Lispector - Aprendendo a Viver


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